segunda-feira, 21 de março de 2016

"Brasil, a razão do Tiririca" por Vasco Gonçalves

A transparência é um factor essencial à boa governação e à promoção da honestidade e da ética governamentais. Contribui para um maior rigor na informação e gestão públicas, para uma redução do défice de informação entre cidadãos e poder governativo, para um diálogo permanente entre eleitores e eleitos, para uma melhor fundamentação da tomada de decisões, para uma fiscalização mais efectiva e eficaz dos resultados obtidos, para um combate mais eficaz à corrupção e à promiscuidade, para um aumento dos níveis de confiança nos decisores políticos e para uma maior participação cívica. Dito isto, à luz da complexidade crescente dos entrópicos e tumultuosos acontecimentos que a uma velocidade vertiginosa se vão sucessivamente multiplicando no Brasil, fruto da explosiva combinação clássica entre crise económica e corrupção, facilmente somos levados a inferir, porventura, como a única certeza de todo este “polvo” de dimensões inimagináveis, de que o sistema político, institucional e partidário brasileiro não rima, (se é que alguma vez rimou) com transparência.
 Não deixa de ser no mínimo paradoxal o facto de ter sido em português, sob a égide da presidência de Lula da Silva, que se procurou dar expressão internacional à necessidade de reduzir o fosso das desigualdades entre ricos e pobres, como é agora também, na língua de Camões, e de novo pela batuta do operário político, do benfeitor do povo, do eterno herói do PT, que toda esta conquista se autodestrói , manchando-se não só a imagem e o bom nome de um povo e de uma nação, como também da própria Comunidade dos Países de Língua Portuguesa.
 A nomeação política de Lula como Chefe da Casa Civil, como única forma de fugir à justiça, apenas confirma definitivamente o que há muito já se escrevia como a crónica de um fim de ciclo anunciado. Além de um acto Indigno e Inadmissível até mesmo em países com pouca cultura e maturidade democráticas, esta nomeação veio tornar claro que Dilma é tão somente uma marioneta política nas mãos do seu artesão Lula da Silva, de quem politicamente já não mais se conseguirá dissociar. Todavia, é preciso que o Brasil perceba que não é a justiça, por si só, que resolverá esta crise de regime, cuja solução só poderá ser efectivamente viável, se passar, impreterivelmente, por uma profunda reforma constitucional capaz de por termo, entre outros problemas, às fontes de corrupção generalizada, nomeadamente a híper-fragmentação do sistema partidário. Caso contrário, o fim desta indecorosa novela, mais cedo ou mais tarde, poderá mesmo assumir contornos próximos de uma guerra civil, sobretudo se nos lembrarmos que foi o próprio Lula, qual sábio visionário, que disse ser o único com poder para “incendiar o Brasil”.
 Mas não obstante a corrupção, que é um problema moroso estruturalmente enraizado no regime brasileiro, o maior drama imediato de toda esta crise reside no facto de, num sistema partidário híper-fragmentado em mais de 3 dezenas de partidos, não se vislumbrar sequer uma alternativa consolidada capaz não só de destronar o PT, como sobretudo de protagonizar um novo projecto de governo que recoloque o país no caminho da prosperidade e progresso económico-sociais e onde o regular funcionamento das instituições não esteja posto em causa. Com efeito, à luz de toda esta explosiva crise de regime, parece cada vez mais inevitável que a curto prazo não se vislumbre uma solução política que não seja a saída, a bem ou a mal, da (ainda) presidente Dilma Rousseff. E sem presidente que seja o fiel da balança políticoinstitucional, sem governo que governe, nem oposição capaz de se afirmar sequer como alternativa possível, quanto mais credível, a tensão social entre classes e a luta entre facções políticassó poderá continuar a agravar-se, agonizando, assim, a ingovernabilidade crónica deste Brasil, onde reina o carnaval todo o ano, e que nunca como antes, deu tanta razão à lógica de se votar e eleger um qualquer Tiririca. Afinal pior do que está, (certamente) que não fica.

Vasco Gonçalves


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