domingo, 24 de abril de 2016

"Somos livres" por Vasco Gonçalves


“Foram dias, foram anos
A esperar um só dia
Alegrias, desenganos
Foi o tempo que doía
Com os seus riscos e os seus danos
Foi a noite, foi o dia
Na esperança de um só dia”

E eis que o mais ansiado e sonhado dia, poeticamente descrito nestes versos de Manuel Alegre, chegou finalmente ao raiar do dia 25 de Abril de 1974 e ao som da intemporal “Grândola, Vila Morena” como música de fundo. “O dia inteiro e limpo, onde emergimos da noite e do silêncio e habitamos a substância do tempo” como com aticismo descreveu Sophia de Mello Breyner. O primeiro dia da nossa madura e sólida democracia, e que ficará para sempre eternizado na história desta nossa quase milenar nação portuguesa como “A Revolução dos Cravos”, que de forma pacífica e ordeira instaurou um regime democrático, livre e plural, pondo fim às quase cinco décadas de ditadura fascista que ensombraram a história da nossa República. O primeiro dia, de todos os que ainda hoje vivenciamos, em que foi o povo quem mais ordenou.

Mas celebrar o 25 Abril é muito mais do que comemorar uma histórica e indelével efeméride e evocar e prestar tributo a todos os que, de forma direta ou indireta, tornam possível a sua realização e lhe deram expressão constitucional. Comemorar o 25 de Abril é celebrar, hoje e sempre, os valores da liberdade e da democracia como móbiles da nossa emancipação política, económica, social e cultural, enquanto povo e enquanto nação, e que nos afirmaram e fizeram senhores do nosso próprio destino. Comemorar Abril é celebrar as suas inalienáveis conquistas como o Serviço Nacional de Saúde, o ensino público e universal, o Estado social público, o Poder Local democrático, o sufrágio livre e universal, o salário mínimo nacional, a plena cidadania das mulheres, entre tantas outras inabaláveis e indeléveis conquistas. Mas é também impreterivelmente, e de forma muito especial, celebrar a Constituição da República Portuguesa, que este ano comemora 40 anos da sua existência. A lei fundamental que, assumindo-se como realidade tangível, consagra, inalienavelmente, os princípios, direitos, liberdades e garantias do nosso regime democrático, filho de Abril. Cumprir e fazer cumprir a Constituição da República Portuguesa significa, portanto, cumprir e fazer cumprir os desígnios e as conquistas de Abril devendo, por isso, constituir-se como matriz primeira e absoluta do progresso e do desenvolvimento económico, social e cultural do nosso país.

Com efeito, a mundividência com que hoje nos confrontamos, lembra-nos, com assombro, que a liberdade e a democracia são valores que para muitos povos e nações não passam ainda de um quimérico desígnio nem de um sonho distante e constantemente adiado, e que mesmo para aqueles, como nós, que respiram liberdade e democracia, jamais as podem considerar como conquistas eternamente adquiridas, nem deixar de lutar sempre pela sua suprema prevalência, enquanto  paradigma universal de organização das sociedades. Assim, o tempo presente e futuro convocam-nos para um combate permanente pela afirmação e defesa intransigentes dos direitos, das liberdades e das garantias de Abril, aquém e além fronteiras, pelo progresso, pela justiça, pela liberdade, pela igualdade e pela fraternidade dos povos e das nações. Somos, assim, chamados a ser parte ativa e integrante de um projeto político de democracia pós-moderna de alcance e vocação universais, que, pela multilateralização, afirme e faça valer o seu primado da liberdade, à luz da globalização da economia e dos mercados; dos movimentos demográficos e dos fluxos migratórios; das redes e das novas tecnologias e de informação e comunicação; das dinâmicas emergentes de uma revolução digital pós-industrial. Temos, portanto, de nos arrogar a assunção de protagonizar um projeto que nos torne capazes de conceber holisticamente a liberdade à luz do nosso tempo e da sua substância, em nome de uma sociedade universal liberta não só do estigma do medo, da ignorância, da pobreza e da dinâmica do imediato e do provisório, mas também do preconceito, do ódio, da intolerância, da insolidariedade, e que não se deixe, jamais, manietar pelo oportunismo populista dos nacionalismos isolacionistas, mas, pelo contrario, que seja centrado e tenha na dignidade e na condição da pessoa humana o alfa e o ómega da sua razão de ser.

O desafio afigura-se hercúleo, sobretudo pela natureza trágica e dramática dos fenómenos e acontecimentos que, cada vez mais, assolam o nosso quotidiano e pela escala e dimensão globais do seu impacto, que não só constituem um marco disruptivo com a realidade anteriormente conhecida, como põem à prova a resiliência das nossas instituições democráticas e limitam a capacidade de resposta e a eficácia das políticas nacionais. Mas a dificuldade do desafio em nada nos deve atemorizar, mas antes agigantar-nos na resistência e na luta, com a mesma magnanimidade, coragem, convicção e determinação com que os protagonistas de Abril forjaram um novo horizonte coletivo de esperança, livre e democrático.

Solenizar, evocar e perpetuar o 25 de Abril e a Constituição da República Portuguesa é, portanto, honrar hoje, amanhã e sempre, em Portugal, na Lusofonia, na Europa e no Mundo, a nossa história, a nossa memória e a nossa identidade coletivas, enquanto povo e nação senhores do seu destino. Porque afinal, como Emília Duarte eternizou na sua canção:

“Somos um povo que cerra fileiras,
Parte à conquista do pão e da paz.
Somos livres, somos livres,
Não voltaremos atrás.”


Vasco Gonçalves
Cronista habitual do Lápis da Verdade


quinta-feira, 21 de abril de 2016

"António Costa, o porta voz do Syriza português" por João Borralho

Começou a deriva extremista no governo de António Costa. Soubemos esta semana que a Comissão Europeia tem dúvidas sobre as medidas aplicadas pelo governo, e tem duvidas que Portugal cumpra os seus objectivos, caso continue no mesmo caminho. Qual a resposta do governo? Não aceitamos!
Para o governo, liderado pelo PS, mas claramente pau mandado do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista Português, diz então que não aceita as recomendações da Comissão, denegrindo ainda mais a imagem de Portugal no exterior. A Comissão alerta para a reversão de todas as reformas feitas no passado, já diz o povo que quando muda de governo desfazem sempre o que o outro fez, ora aí está a prova. O problema é que se desfaz por desfazer, e desfaz-se para satisfazer os caprichos dos partidos da extrema-esquerda, porque mal vai o PS no dia em que disser “não” aos seus Best Friends, como os apelidou Paulo Portas.
A questão é que não é só a Comissão Europeia a fazer recomendações, é o FMI, é as instituições nacionais que avaliam o desempenho de Portugal, é a oposição, é os comentadores, os economistas, é Mario Draghi, em suma, todos, menos a esquerda. É como a história popular de que os outros é que vão em contra-mão eu é que vou no sentido correto. Portugal está a reverter a passos largos tudo o que era cortes e reformas estruturais, pondo assim em causa a garantia da estabilidade económica. Basta pensarmos nas nossas casas, quando temos menos dinheiro, poupamos, e quando começamos a ter, voltamos a comprar aos poucos e poucos, o Estado funciona mais ou menos da mesma forma. Quando se devolve tudo de uma vez, abre-se um buraco, buraco esse que, se não for compensado, criará défice, logo mais despeça e menos receita, mais divida, se nos relembrarmos, é exactamente o que aconteceu em 2011.
E assim, Portugal recebe avisos constantes de que deve ter atenção, que as coisas têm de ser feitas de forma gradual. Ignorados estes avisos por parte de António Costa e da sua geringonça, eis que a Comissão diz que são necessárias medidas adicionais ou então as metas a que Portugal se propõem estão claramente em risco. António Costa diz que não, que não vai alterar nada… Faz-nos lembrar Tsipras, na Grécia, quando ganhou as eleições, virava a página de austeridade, não fazia cortes e devolvia tudo aos contribuintes, no fim acabou por assinar um programa de ajuda externa duríssimo, com cortes nas pensões, salários, e contenção de despesa enormes.
De que serve para nós não querermos ver o que está diante dos olhos de todos? Neste caso serve para endividar o país e levar de novo Portugal a uma situação insustentável. E quem paga depois? Os contribuintes…. António Costa e a geringonça agem como se fossem o Syriza da Grécia, dizendo que não a Bruxelas, dizendo que querem tudo mudado, esquecendo um pormenor: não têm dinheiro para isso… Que só por acaso é a coisa mais importante para fazer as mudanças que eles querem.

Portugal com a geringonça e os geringonços, perde a passos largos a credibilidade externa que criou com o esforço de todos os portugueses, com o dinheiro que todos nós fomos obrigados a perder, este governo pura e simplesmente deita os esforços de todos nós por água abaixo. E mais! Prejudica a nossa credibilidade e ainda se coloca em posições que a Grécia adoptou no passado e que levou ao seu desespero económico. Esta esquerda faz o mesmo caminho que fazia o Syriza na Grécia para contentamento de Catarina Martins. É uma Grécia que queremos para Portugal? Será que são todas as instituições que estão em contra-mão e a ver as coisas do prisma errado? Ou será António Costa e o governo que para se manter no poder aceitam todas as exigências de extremistas, colocando em perigo Portugal, os portugueses e os seus rendimentos? Atrevo-mo a dizer, que para mal de todos nós, é a segunda opção…

João Borralho
Criador do Lápis da verdade




segunda-feira, 18 de abril de 2016

"Impeachment querida!" por João Borralho

Após o voto decisivo o povo brasileiro saiu ontem às ruas, ouvia-se “tchau querida”, “fora Dilma, fora PT”. Renasce a esperança para o Brasil de que o sentimento de impunidade não durará muito mais, seja neste caso seja em muitos outros.
Os deputados da câmara, aprovaram o Impeachment à Presidente Dilma, processo agora segue para o senado, mas a prova de fogo já foi ultrapassada na madrugada anterior. Após longas horas de “sins” e “nãos”, acompanhados com declarações de voto efusivas e estranhas para a nossa democracia, o “sim” ganhou e a vontade dos milhares daqueles que saiam à rua vezes e vezes para dizer “basta”, foi assim cumprida.
Vejamos então a situação. A Presidente Dilma já estava debaixo de fogo há bastante tempo, o povo já saia às ruas muitas vezes, mesmo antes deste processo para pedir a demissão da Presidente. Com o processo de Lula da Silva os ânimos acenderam ainda mais contra o PT. E o pior foi depois… A Presidente Dilma oferecia um cargo no governo ex-Presidente do Brasil para que este fosse julgado num supremo tribunal e assim se conseguir evitar a sua prisão. Isto para um Presidente de um país é inaceitável. Foi este caso que levou a este impeachment, se a Presidente não tivesse oferecido o cargo ao Presidente Lula, nada disto teria acontecido, como se diz em Portugal, pôs-se a jeito.
Os deputados da câmara dos deputados em boa verdade, também não tinham grande moral (alguns) para julgar o que quer que seja, visto que grande parte deles estão envolvidos em processos de corrupção e lavagem de dinheiro. É verdade que eles não tinham a moral política de julgar este impeachment, mas o processo era constitucional, foi aberto e aprovado para votação e apreciação, tendo moral ou não, teriam de o julgar. Na política a ética e amoralidade é algo que é de louvar, infelizmente, nem os deputados inscritos em processos judiciais, nem a Presidente a teve no meio disto tudo.
Por vezes dizemos em gíria popular que tomou o próprio veneno, foi o que aconteceu ontem. A Presidente tomou a iniciativa de usar o seu poder para tirar um amigo de um processo na justiça, ao paço que os deputados tomaram o seu poder para a destituir do cargo.
O impeachment na minha modesta opinião, foi aprovado, e muito bem. Os deputados podem não ter moral, mas a Presidente também não a tem. A “limpeza” no Brasil tem de começar por algum lugar para que os brasileiros sintam que ninguém sai impune, este impeachment é a esperança para os brasileiros que esperam justiça. Assim se espera que tudo corra bem, que o processo seja aprovado, e a Presidente seja afastada do cargo, para que se possa abrir caminho a uma nova jornada para o país.

Termino como comecei, e termino com a frase que marcou sem dúvida a noite e a história do Brasil: Tchau querida! 

João Borralho 
Criador do Lápis da verdade


domingo, 17 de abril de 2016

Abril, geringonça a mil!

A gerigonça nos últimos dias não tem passado bons momentos. Primeiro as demissões de João Soares e do Secretário de Estado da Juventude e desporto, depois parece que houve socialistas incomodados com o tom de Catarina Martins nos debates, a contratação do amigo de Costa e por último, e a pior de todas, a Comissão Europeia viemos hoje a saber pela comunicação social, parece que já faz avisos de que são necessárias medidas adicionais.
Primeiro as demissões. João Soares como já nos habituou, tem uma postura de alguém descuidado, por vezes nem mede muito bem as coisas antes de as fazer, um impulsivo diria um conhecedor de psicologia. Primeiro a polémica do afastamento do diretor do CCB, em que João Soares adquire uma postura totalmente condenável em vir dizer a público “que se não sai por ele, demito-o eu”. Isto não calha nada bem a um Ministro de um governo. O pior ainda estava para vir, a oferecer “bofetadas” a quem o critica, um Ministro que não convive bem com as criticas, ou com a democracia. Ele pode criticar, mas criticarem a ele, isso está fora de questão! Uma pessoa que julgo que nunca esteve à altura de assumir tal pasta num governo. Depois foi o Secretário de Estado, demitiu-se porque o Ministro da Educação se intrometia nas suas contratações e em questões da sua jurisdição. Todos já sabemos que este é um Ministro da Educação mau, nada preparado, nada apto para o cargo até aqui talvez dos piores Ministros, limita-se a fazer gestão corrente… Outro Ministro que não convive bem com a democracia, visto que tem de por o dedo em toda a parte, e dá ordens como se dava no tempo da outra senhora, não sabe bem por onde vai, só sabe que por ali não é…
E o tom da parceira de coligação Catarina Martins no debate com o Primeiro-ministro, bem se aquilo é ser parceiro de coligação, nem quero saber o que é ser da oposição para ela. A deputada arrasou com António Costa no debate, todos sabemos que Catarina Martins e o Bloco de Esquerda só se aliaram ao PS para o derrubar, para fazer perder votos, capitalizando para si esses mesmos, portanto não sei qual é o espanto dos socialistas que se mostraram incomodados, com uma coisa que já todos sabíamos.
Quanto à contratação do amigo do Primeiro-ministro para consultor, julgo que há uma pergunta a fazer, o que seria se o senhor fosse contratado por Passos Coelho, o que a esquerda não diria, viria a público todos os dias criticar e pedir demissões. Mas como a contratação é de esquerda, ah, então é boa contratação… Esta é a lógica da esquerda: nós fazemos tudo bem, os outros fazem sempre tudo mal, nós somos os donos da democracia, dos direitos, das verdades, os outros, esses não sabem nada. Bem prega Frei Tomás, faz o que ele diz, não faças o que ele faz.
Por fim aquela noticia mais preocupante. A Comissão Europeia terá alertado na 3ª avaliação do pós-Troika que Portugal necessita de medidas adicionais para cumprir as suas metas. Todos sabíamos que isto iria acontecer, até o próprio governo o sabe, quem devolve tudo de uma vez fica com um buraco orçamental, e como é que se tapa esse buraco? Com impostos… O governo para se manter no poder deu mundos e fundo tomando uma atitude irresponsável, felizmente que os portugueses já percebem que depressa e bem, não há quem. Isto é ainda mais maquiavélico se pensarmos que o governo deu tudo, para criar esse buraco, para a Europa pedir austeridade, e para o governo vir dizer para as televisões a ladainha de que Bruxelas é que quer austeridade, que é intrometida em Portugal e que a culpa de aumentar impostos não é do governo…

Uma geringonça que começa a dar os primeiros sinais de que é mesmo uma geringonça, mas tal como Paulo Portas disse ao estilo de Luísa de Gusmão quando a esquerda derrubou o governo, também o volto a repetir, “mais vale ser Primeiro-ministro por uns tempos, do que líder da oposição para a toda a vida”. Frase que António Costa deve lembrar todos os dias ao acordar. 

João Borralho
Criador do Lápis da verdade


domingo, 3 de abril de 2016

"Social-Democracia, Sempre ou quando Convém?" por Vasco Gonçalves

Meio ano após as eleições legislativas, cuja previsibilidade do resultado se traduziu numa inesperada e imprevisível geringonça governativa, aqueles que, saídos vencedores do acto eleitoral, esperavam estar hoje no exercício do poder governativo, vêem-se hoje, por força do funcionamento da democracia, confrontados com a necessidade de se afirmarem politicamente enquanto oposição social-democrata. As opções que se fazem têm naturalmente consequências e, por isso, Passos Coelho tem pela frente, a partir deste congresso do PSD, porventura o maior desafio político da sua carreira, enquanto líder de um partido que tarda em mudar o chip do saudosismo do passado para a realidade presente e para a visão prospectiva do futuro. Além do mais, acresce o facto de Passos Coelho ter hoje como improveis adversários a dupla do Sr. Feliz e do Sr. Contente, entenda-se Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa. O período de aceitação e adaptação a esta nova geringonça, cujo processo foi deveras moroso, crispado e indigesto, já devia ter os dias contados e terá, por força das circunstancias, que ficar definitivamente encerrado neste congresso. Tal como afirmou o insuspeito Eurodeputado do PSD, Paulo Rangel, “o partido já teve tempo de se adaptar e devíamos já estar numa postura mais interventiva e agressiva, uma oposição mais forte em vários domínios”. Com efeito, para que essa nova postura do PSD seja efectivamente uma realidade, não basta adotar o óbvio, ou seja, a social-democracia como alfa e ómega discursivo e programático. É preciso assumir, não só o pensamento, como sobretudo a ação política a ele correspondentes. Algo que Passos Coelho, relativamente à social-democracia, tarda em demonstrar desde que assumiu a liderança do PSD há já 6 anos. Tendo em conta o que dizem na oposição e o que (não) fazem quando são governo, não admira que os políticos e os partidos vivam permanentemente rotulados ao lema do “olhem para o que eu digo, mas não olhem para o que eu faço”. Precisamos de políticos que assumam o bem-estar social como prioridade não apenas do seu pensamento mas sobretudo da sua acção, onde as pessoas valham como isso mesmo, pessoas, e não como números ou células de Excel, onde as pessoas sejam o a prioridade das politicas económica, afinal são elas os agentes económicos primários, pois sem elas não havia empresas. Em bom rigor, com o PS de mãos dadas com a esquerda radical, alargou-se ainda mais o espaço para os sociais-democratas ocuparem privilegiadamente o espectro político que tradicionalmente disputavam com os socialistas, mas que o PS de Costa há muito desdenhou e do qual se afastou, o espetro político entre o marxismo e o liberalismo. Com efeito, se o querem ocupar, os sociais-democratas não podem partir do pressuposto de que, bastando o PS afastar-se desse espectro político, o eleitorado que o compõe automática e naturalmente virá ao encontro do PSD sem ser preciso grandes esforços ou iniciativas. Nada mais errado. Sobretudo quando o PSD tem ele próprio adotado uma postura radical, de recusa e negação total e absoluta a tudo o que venha da parte da geringonça, mesmo em matérias fundamentais para a governação do país, ao estilo do que nos habituaram o BE e o PCP. O PSD não pode, também, limitar-se a correr atrás da iniciativa alheia nem a andar a reboque das críticas e das desconfianças de Bruxelas, dos mercados e das agências de rating. Passos Coelho terá, assim, de ser capaz de afirmar o PSD como muito mais do que o partido que apenas chega ao poder em circunstâncias especiais e difíceis, não tanto por mérito próprio, mas mais por demérito dos adversários. Ficar de braços cruzados à espera que os outros falhem, neste caso que geringonça caia, para, uma vez mais, o poder lhe cair no colo não é próprio de um partido responsável, que se diz vanguardista e se assume como social democrata. Além do mais a lógica do voto útil já deixou de ser isso mesmo, lógica, e o CDS, percebendo isso primeiro que o PSD, já se fez de novo à estrada com novos quadros, uma nova liderança e com uma nova estratégia política que o colocam, enquanto oposição, numa posição bem mais favorável do que o PSD. O slogan "social-democracia, sempre" dificilmente passará de um conveniente e oportuno chavão político, em jeito de soundbite, para tentar passar uma ideia que no fundo, com a atual liderança do PSD, tem estado a anos luz do seu significado, e que apenas visa reconquistar a atenção de um eleitorado de quem o PSD de Passos Coelho também há muito progressivamente se afastou, mas que ao longo dos anos tem constituído uma parte significativa da sua base social de apoio, e que é indispensável para alcançar a desejada maioria absoluta. Mas final poderá um líder partidário, em menos de meio ano, vestir uma roupagem ideológica que, não raras vezes, destoa daquilo que pôs em prática nos últimos 4 anos e meio e que já defendia, mesmo antes de ser Primeiro-Ministro? O próprio Passos Coelho fez questão de sublinhar no discurso de abertura do congresso que não mudaria o seu estilo nem a sua linha de orientação. Além do mais, só adopta como slogan “social democracia, sempre” quem de facto sente que, pela sua ação política, não é natural e intrinsecamente identificado com ela. É que ser sempre social democrata é à partida e por natureza, o slogan intrínseco de todo qualquer militante do PSD. Por analogia, Jerónimo de Sousa jamais precisará de adoptar como slogan “Comunismo, sempre” pelo facto de ninguém duvidar que o comunismo é, e será sempre, a matriz ideológica que está na génese das politicas e proposta do PCP, não havendo, assim, necessidade nenhuma de o dizer. Ainda assim, esta ideia de resgatar a social-democracia, segundo Passos Coelho, não é nova. Já o programa político do PSD no último biénio (já depois da saída da Troika), em tese, tinha como premissas base a aposta e reforço da social-democracia portuguesa. O problema é que depois quando se está no exercício do poder é que se revela e se põe à prova a verdadeira (ou falsa) natureza identitária social democrata. Em suma, não é suspirando pelo que já lá vai, nem vivendo eternamente agarrado a um passado político que ninguém quer que se projecte no futuro, que se presta um bom serviço a Portugal e aos portugueses. Quem hoje tem ou quer ter responsabilidades políticas, seja no governo ou na oposição, não pode adoptar como estratégia política o discurso da negação da estratégia governativa só porque dela discorda. Tem de dizer ao vem, pelo que vem, e como vem. Nesse sentido, e atendendo a que este congresso se realizou em pleno período pascal, espera-se, a bem da democracia portuguesa, que o PSD, abandonando, de vez, o luto e as mágoas que até agora ainda não parou de carpir, ressuscite para a vida política, à luz da nobreza que é servir o país tanto no governo como na oposição. Se é Passos Coelho o Messias prometido da social-democracia, capaz de tamanho dom da ressurreição ideológica, é o que veremos de ora em diante. Porque, para já, o melhor que tem sido capaz é de ser um líder incontestado, a encarnar um lamurioso papel de Maria Madalena.

Vasco Gonçalves


sábado, 2 de abril de 2016

"Não façamos aos outros aquilo que não gostamos que façam a nós" por João Borralho

Esta semana foi apresentado na Assembleia da Republica um voto de condenação pela prisão de 17 ativistas angolanos. Primeiro que tudo, dizer que num mundo do Sec XXI a diferença politica não deveria ser pretexto para qualquer ato menos digno. Dizer ainda que pessoalmente, atenção, pessoalmente condenaria os atos, mas um voto aprovado pela Assembleia da República não seria mais do que uma acha para a fogueira.
As nossas relações com Angola, sabemos todos que não têm sido as melhores nos últimos tempos, e parece que continuarão assim. Angola é um Estado soberano, independente, e tem total autonomia para fazer aquilo que quiser. É certo que terá sempre uma forte ligação a Portugal, pela razão histórica de ter sido uma ex colónia deste nosso império lusitano. Infelizmente, o império também ele vai pelas ruas da amargura. Mas voltamos ao que interessa. Por Angola ter sido uma colónia portuguesa não quer dizer que enfiemos a nossa agulha em todos os botões que eles cozem.
Angola é um Estado independente, Portugal não tem nada que se meter nos assuntos angolanos, exceto aqueles que nos dizem respeito, coisa que este, está longe de nos dizer. A condenação de alguém a prisão por ter ideais políticos diferentes do regime diferente é sempre condenável, mas temos de manter o distanciamento político, e a diplomacia necessária para a boa convivência com os restantes países.
Imagine-se o que seria se em Portugal ocorresse o mesmo, e Angola viesse aprovar votos de condenação pelo que os portugueses faziam… Seria um intrometimento em assuntos nacionais, que só a nós nos diziam respeito. Pois agora, se Portugal aprovasse este voto de condenação, seria um intrometimento no regime e na justiça de Angola. Para não falar que o poder político português iria condenar o poder judicial angolano! (Então e a separação de poderes?)
Angola pode não agir bem, mas por ter sido território nacional, não quer dizer que possamos dizer, fazer e querer ditar tudo o que ocorre por lá. Porque como nós gostamos de viver num país em que ninguém se intromete nos nossos assuntos, também eles devem gostar do mesmo. Fazer uma declaração de atenção é uma coisa, fazer votos de condenação pelo órgão máximo do poder político em Portugal, é outra.
Se este voto tivesse sido aprovado, as relações ficariam ainda piores do que já se encontram, para já não falar no conjunto de reações que certamente desencadearia. Há que saber resolver os assuntos diplomaticamente, e não há força e com ímpetos radicais de quem quer por o nariz onde não é chamado.

Por fim, dizer mais uma vez que não estou a defender Angola, nem o que aconteceu, estou a defender a diplomacia, o bom senso e a sensatez. 

João Borralho
Criador do Lápis da verdade